segunda-feira, 23 de março de 2015

 Um bom exemplo de uma cronica argumentativa:

 “Quanto nós merecemos?”
Lya Luft

O ser humano é um animal que deu errado em várias coisas. A maioria das pessoas que conheço, se fizesse uma terapia, ainda que breve, haveria de viver melhor. Os problemas podiam continuar ali, mas elas aprenderiam a lidar com eles.
Sem querer fazer uma interpretação barata ou subir além do chinelo: como qualquer pessoa que tenha lido Freud e companhia, não raro penso nas rasteiras que o inconsciente nos passa e em quanto nos atrapalhamos por achar que merecemos pouco.

Pessoalmente, acho que merecemos muito: nascemos para ser bem mais felizes do que somos, mas nossa cultura, nossa sociedade, nossa família não nos contaram essa história direito. Fomos onerados com contos de ogros sobre culpa, dívida, deveres e… mais culpa. Um psicanalista me disse um dia: – Minha profissão ajuda as pessoas a manter a cabeça à tona d’água. Milagres ninguém faz.

Nessa tona das águas da vida, por cima da qual nossa cabeça espia – se não naufragamos de vez –, somos assediados por pensamentos nem sempre muito inteligentes ou positivos sobre nós mesmos.

As armadilhas do inconsciente, que é onde nosso pé derrapa, talvez nos façam vislumbrar nessa fenda obscura um letreiro que diz: “Eu não mereço ser feliz. Quem sou eu para estar bem, ter saúde, ter alguma segurança e alegria? Não mereço uma boa família, afetos razoavelmente seguros, felicidade em meio aos dissabores”. Nada disso. Não nos ensinaram que “Deus faz sofrer a quem ama”?
Portanto, se algo começa a ir muito bem, possivelmente daremos um jeito de que desmorone – a não ser que tenhamos aprendido a nos valorizar.

Vivemos o efeito de muita raiva acumulada, muito mal-entendido nunca explicado, mágoas infantis, obrigações excessivas e imaginárias. Somos ofuscados pelo danoso mito da mãe santa e da esposa imaculada e do homem poderoso, pela miragem dos filhos mais que perfeitos, do patrão infalível e do governo sempre confiável. Sofremos sob o peso de quanto “devemos” a todas essas entidades inventadas, pois, afinal, por trás delas existe apenas gente, tão frágil quanto nós.

Esses fantasmas nos questionam, mãos na cintura, sobrancelhas iradas: – Ué, você está quase se livrando das drogas, está quase conquistando a pessoa amada, está quase equilibrando sua relação com a família, está quase obtendo sucesso, vive com alguma tranquilidade financeira… será que você merece? Veja lá!

Ouvindo isso, assustados réus, num ato nada falho tiramos o tapete de nós mesmos e damos um jeito de nos boicotar – coisa que aliás fazemos demais nesta curta vida. Escolhemos a droga em lugar da lucidez e da saúde; nos fechamos para os afetos em lugar de lhes abrir espaço; corremos atarantados em busca de mais dinheiro do que precisaríamos; se vamos bem em uma atividade, ficamos inquietos e queremos trocar; se uma relação floresce, viramos críticos mordazes ou traímos o outro, dando um jeito de podar carinho, confiança ou sensualidade.

Se a gente pudesse mudar um pouco essa perspectiva, e não encarar drogas, bebida em excesso, mentira, egoísmo e isolamento como “proibidos”, mas como uma opção burra e destrutiva, quem sabe poderíamos escolher coisas que nos favorecessem. E não passar uma vida inteira afastando o que poderia nos dar alegria, prazer, conforto ou serenidade.

No conflitado e obscuro território do inconsciente, que o velho sábio Freud nos ensinaria a arejar e iluminar, ainda nos consideramos maus meninos e meninas, crianças malcomportadas que merecem castigo, privação, desperdício de vida. Bom, isso também somos nós: estranho animal que nasceu precisando urgente de conserto.
Alguém sabe o endereço de uma oficina boa, barata, perto de casa – ah, e que não lide com notas frias?


7 comentários:

  1. Uma música é uma cronica?

    Ideologia
    Cazuza
    Meu partido
    É um coração partido
    E as ilusões
    Estão todas perdidas
    Os meus sonhos
    Foram todos vendidos
    Tão barato que eu nem acredito
    Ah! Eu nem acredito

    Que aquele garoto
    Que ia mudar o mundo
    Mudar o mundo
    Frequenta agora
    As festas do "Grand Monde"

    Meus heróis
    Morreram de overdose
    Meus inimigos
    Estão no poder
    Ideologia!
    Eu quero uma pra viver
    Ideologia!
    Eu quero uma pra viver

    O meu prazer
    Agora é risco de vida
    Meu sex and drugs
    Não tem nenhum rock 'n' roll
    Eu vou pagar
    A conta do analista
    Pra nunca mais
    Ter que saber
    Quem eu sou
    Ah! Saber quem eu sou

    Pois aquele garoto
    Que ia mudar o mundo
    Mudar o mundo
    Agora assiste a tudo
    Em cima do muro
    Em cima do muro!

    Meus heróis
    Morreram de overdose
    Meus inimigos
    Estão no poder
    Ideologia!
    Eu quero uma pra viver
    Ideologia!
    Pra viver

    Pois aquele garoto
    Que ia mudar o mundo
    Mudar o mundo
    Agora assiste a tudo
    Em cima do muro
    Em cima do muro

    Meus heróis
    Morreram de overdose
    Meus inimigos
    Estão no poder
    Ideologia!
    Eu quero uma pra viver
    Ideologia!
    Eu quero uma pra viver
    Ideologia!
    Pra viver
    Ideologia!
    Eu quero uma pra viver

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  5. A música é uma crônica quando apresenta uma opinião pessoal a cerca de um tema presente no cotidiano social.

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    1. Esta música aqui postada narra uma opinião politica e acredito que é sim uma crônica.

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  6. Esse texto, citado a cima, penso que ele trás nos parágrafos argumentos e opinião singelas mas tem.

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